Talak, talak, talak

 

Talak, talak, talak

Solange Amado

A tia estava lá no restaurante chique com um amigo rico, que estava com pressa. Ia viajar pra Dubai. Almoço de domingo. Na mesa ao lado, duas madames discutiam seus respectivos divórcios. As crianças, é claro, ficaram com elas (qual empresário bem sucedido vai ter tempo para essas distrações?). Em compensação, elas exigiam pensão, cartão de crédito, babá, cozinheira, faxineira, carro, motorista, gasolina, a casa, a prataria e os advogados que entram e saem. E mais tudo o que vier no pacote.

Papo vai, papo vem, e lá foi a tia resvalando para um passado remoto, quando fuxicava os grossos calhamaços do pai, que tinha de resolver essas pendengas intermináveis: quem fica com o que: a louça inglesa do século XVII, constando de... um faqueiro de prata com tantas facas, tantos garfos, uma molheira (ela não sabia o que era) de cristal, etc. etc. Aquela literatura era chatissima! Ela mal sabia ler,  apreciava Monteiro Lobato e acabava as lições  do “Livro de Lili”, ambos politicamente incorretos hoje.

Só como parêntese, ganhou há anos, um biografia de Pancho Villa, com quase 900 folhas e não leu; se recusa a perder tempo com um bandido. Mas vai reler Monteiro Lobato.

De qualquer maneira, entre Pancho Villa e aquela conversa no restaurante, pende para o lado de Pancho Villa. Afinal de contas, os brutos também amam... e se separam. Só não se sabe se dividem os filhos e a prataria. Vale dar uma olhada, em dias cinzentos, quando há muita suspiração e pouca inspiração.

Afinal, se “criar é matar a morte”, como dizia Romain Rolland, Todas as armas são válidas. Ela está começando a considerar esse bandido gordinho e bigodudo. Não crê que ele possa “matar a morte”, mas vai passando a conversa mole nela até segunda ordem.

OK. Mas o assunto aqui é outro. (A imaginação da tia é meio errática. É preciso pegá-la pela mão e trazer de volta ao cerne da questão). E o cerne da questão é o Afeganistão. Rimou. Mas vai ficar assim mesmo.

Podem ir lá procurar no “As meninas ocultas de Cabul”. Lá não tem essa burocracia ocidental enlouquecedora. O marido chega para a sua nobilíssima esposa, na cozinha e diz: “Talak, talak, talak (três vezes). Pronto. Tá divorciado. E a mulher pode ir lamber sabão. Ele fica com a filharada, com a casa, pega outra mulher, bota no lugar e vida que segue. Não tem nada dessa coisa de incompatibilidade de gênios e outras milongas. Como é que a ex mulher vai ficar, não é da conta de ninguém.

Pois é. Esse negócio de Direito, Liberdade, Democracia. É tudo muito complicado. Devia ser mais simples. Eu mando e o outro obedece. Eu faço boas escolhas, o outro só faz merda. Eu sou inteligente e o outro é burro. Eu sou o mocinho e o outro é o bandido. Só que não. Talak, talak, talak. Vão cantar noutra frequesia!

E se permanecerem comportados, na próxima, a tia promete contar a história das “Meninas Ocultas de Cabul”. Só se se inscreverem no seu canal, tocarem o sininho e derem o seu like ou o seu dislike. Desde já ela agradece.

 

 

 

 

 

 

Maria Solange Amado Ladeira              14/06/2022

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