Palavras arretadas


Postado em 26/02/2016
Palavras arretadas
Solange Amado

Foi assim. Ele me mandou medir e pesar as palavras. Só isso? Peguei fita métrica e uma balança, tirei do congelador um estoque de palavras arretadas (ou retadas), e levando-se em conta que retar é um verbo intransitivo que significa excitar sexualmente, fica claro que minhas intenções são, no mínimo, duvidosas.
Sem estresse. Todo mundo sabe,  e Nélida Pinõn já avisou, que palavras são vagabundas, sem nenhum comprometimento ético. Sem peso ou medida. Se apresentam vadias e peladas, cordiais e languidas, na maior sem vergonhice. Eu só as uso e gigolo porque elas se oferecem sem nenhuma pudícia. Botam a cara no mundo pro que der e vier. E nós, os retados, não fazemos cerimonia.
Mas não se trata de caçar ética e moral onde não tem. Nem com fita métrica ou balança. A gente se lança de cara limpa nessa coisa de maluco. Ou escrever é coisa de mameluco? Pelo menos é mistura. É sim uma mistura exdrúxula, um caldeirão de bruxa. Com rima e tudo. Se você quiser. Que sem tempero, nem com muito esmero. Sacaram?
Seja o que for, a terra tremeu em Antofagasta e minhas palavras se espalharam. Catei daqui e dali antes que o tsunami as engolisse  apavoradas e tremulas. Não consegui  número suficiente pra começo dessa conversa meio bamba.
Não importa. São palavras estrangeiras mesmo.  E lá em Antofagasta não sou amiga do rei, não tenho as palavras que quero no texto que escolherei. E se querem saber, nem aqui.
Só me resta pegar meu boné. Não deu. Fiquem vocês arretados. Que o chão recomeçou a tremer.


Maria Solange Amado Ladeira      08/04/2014

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