Palavras arretadas
Solange Amado
Foi assim. Ele me mandou medir e pesar as palavras. Só isso?
Peguei fita métrica e uma balança, tirei do congelador um estoque de palavras
arretadas (ou retadas), e levando-se em conta que retar é um verbo intransitivo
que significa excitar sexualmente, fica claro que minhas intenções são, no
mínimo, duvidosas.
Sem estresse. Todo mundo sabe, e Nélida Pinõn já avisou, que palavras são
vagabundas, sem nenhum comprometimento ético. Sem peso ou medida. Se apresentam
vadias e peladas, cordiais e languidas, na maior sem vergonhice. Eu só as uso e
gigolo porque elas se oferecem sem nenhuma pudícia. Botam a cara no mundo pro
que der e vier. E nós, os retados, não fazemos cerimonia.
Mas não se trata de caçar ética e moral onde não tem. Nem com
fita métrica ou balança. A gente se lança de cara limpa nessa coisa de maluco.
Ou escrever é coisa de mameluco? Pelo menos é mistura. É sim uma mistura
exdrúxula, um caldeirão de bruxa. Com rima e tudo. Se você quiser. Que sem
tempero, nem com muito esmero. Sacaram?
Seja o que for, a terra tremeu em Antofagasta e minhas
palavras se espalharam. Catei daqui e dali antes que o tsunami as engolisse apavoradas e tremulas. Não consegui número suficiente pra começo dessa conversa
meio bamba.
Não importa. São palavras estrangeiras mesmo. E lá em Antofagasta não sou amiga do rei, não
tenho as palavras que quero no texto que escolherei. E se querem saber, nem
aqui.
Só me resta pegar meu boné. Não deu. Fiquem vocês arretados.
Que o chão recomeçou a tremer.
Maria Solange Amado Ladeira 08/04/2014
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