O paraíso


Postado em 25/02/2016
O paraíso
Solange Amado
Eva e Adão. Dizem que a trapalhada começou por aí. Não posso dizer que sim, só sou especialista no meu paraíso particular; dos jardins do Eden não conheço nenhuma plantinha. Mas faz sentido. A história pregressa do paraíso mostra que nos primórdios, os bichinhos,as plantinhas, viviam felizes para sempre: namoravam, curtiam, se acasalavam, se reproduziam sem necessidade de discutir a relação ou  disputar o cobertor, e nenhum bichinho ou florzinha sequer se lembrava de perguntar: “foi bom pra você?”. Dizem até que dormiam de conchinha. Era bom para todo mundo. Era um paraíso generoso e abrangente. Pra falar a mais pura verdade, não sei se foi uma jogada de marketing que pegou, essa ideia de harmonia e perfeição pré Eva e Adão.
Tenho pra mim, que Deus foi tomado pelo mal de siècle, e essa noia di vivere o fez querer incrementar essa perfeição com um pouco de cravo e canela usando Gabriela, ou melhor Eva, a sacana. A única coisa em que realmente acredito é que Eva não usou a maçã como propina. Quando é que maçã já deu ibope com alguém? Muito mais viável uma garrafa de cerveja, uma partida de futebol e a promessa feita a Adão de que mais tarde, ele ia, em pessoa, adentrar o gramado após as preliminares. Pelo menos é essa a ideia que os homens têm de paraíso.
É verdade, tem a tal da serpente, que entrou na história do paraíso só pra atrapalhar, como se Eva não fosse capaz de uma perversãozinha da própria lavra. O que sei é que, Adão, já salivando pra bater uma bolinha naquele gramado paradisíaco, enfiou o pé na jaca. E desde então, essa coisa de propina vem grassando como uma peste incontrolável pelo nosso paraíso tupininquim, poluindo terras, mares e ares pelo mundo afora. Tudo em troca de uma maçã. Quem há de?
Mas o que fez Eva complicar o seu mundinho perfeito? A obviedade talvez. A falta de sutileza. Nada era insinuado. Já estava ali, tudo pelado, nu, escancarado, explicado, dominado. Cadê o tempero da Eva-Gabriela? Cadê o fogo, a sensualidade do Adão-Vadinho? Cadê o paraíso-dona flor com seus dois maridos?
O que sei eu? Mas penso que aquele paraíso sofreu de falta de malemolência. Faltou o corte, a jaça naquele brilhante.
É a falta que empurra o desejo. E o desejo cria. Foi preciso desandar o caldo, provocar o corte, implantar o limite na completude.  Foi preciso atrapalhar o encaixe, inverter a mão. Pecar. Eva e Adão. Agora sim, podemos inventar o nosso paraíso. E sacudir a vida, que o açúcar tá no fundo.
Maria Solange Amado Ladeira –    21/11/12



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