Vamos pensar

 


Vamos pensar

Solange Amado

“Senhores, acabou-se a comida. Vamos pensar”.

Neca. Esta não é uma frase de algum dos atuais líderes mundiais. A frase vem dos confins de 1.700 e foi proferida por Sir Robert Rutheford, lá nas montanhas de Dakota do sul ou do norte, não sei bem. O “Sir” vem de que ele era inglês de alguma extirpe e foi para os EEUU para colonizar aquele país, leia-se, dizimar os índios, os legítimos habitantes da terra e botar lá a trapalhada do homem branco.

Isso é o que me conta Frederick Forsyth, no seu livro “Murmúrio do Vento”. Mas vamos a Sir Rutheford. Ele e seus bravos soldados construíram um forte , no meio das montanhas, plantações em volta, caça, pesca à vontade. E tinham a nobilíssima missão de expulsar os sioux e cheyennes de suas terras, terras que até então, eram lá deles. Sem caça, sem pesca e longe dos rios, os índios morreriam de fome e de sede e os homens brancos ficariam com a terra.

As escaramuças eram constantes. Os índios não se entregavam fácil. Partiam pra cima com machadinhas,  flechas e muita coragem. Era isso ou morreriam de fome. No meio da labuta os índios proferiam o seu famoso “grito de guerra” e lá iam com tudo. Só agora o livro de Forsyth me explica  que esse grito, não era pela batalha, para matar o outro, mas um “grito  para a morte”, a dele próprio. Ele estava simplesmente confiando sua alma aos cuidados do grande espírito.

Vai daí que um dia, os índios atacaram o forte de surpresa. Todo mundo tranquilo, caçando, pescando, lavrando a terra em volta, colhendo, pra ter o que comer durante os terríveis invernos da região, e eis que a escaramuça começa do nada. “Todo mundo pra dentro!” Ordena o comandante. “Temos comida, bebida, armas e a mulherada pra cozinhar. Podemos resistir muito tempo. O inimigo desiste”.

Ledo engano. Os inimigos não desistiram. Tinham comida em abundância em rios e florestas, não tinham medo do inverno, e sobretudo, tinham liberdade, coragem e agilidade. O homem branco, ao contrário, tinha medo. Medo, sede, fome e privações, sentimento de impotência. Confinado num espaço limitado, faltava-lhe a liberdade de ação. Bota tudo isso em um liquidificador e temos um baita caos.

Ainda não cheguei ao fim do livro. Talvez, a cavalaria americana tenha chegado a tempo. Vá saber.  O certo é que, provavelmente, na base do “farinha pouca meu pirão primeiro” muitas foram as baixas, mas Sir Rutheford sobreviveu e ainda se tornou Senador nos EEUU. E séculos depois, a gente sabe o que aconteceu com a população indígena. O que é apenas um detalhe no livro.

O certo é que, favas contadas, todo mundo vai ser preso assim mesmo. Nem heróis, nem vilões, embora, é claro, todos se achem os guardiães do Templo da Verdade.

A coisa tá nesse pé. Do lado de fora, os índios acham que vão conquistar o forte e manter a sua terra. Do lado de dentro, os homens brancos resistem bravamente e creem que vão conquistar o mundo e fazer dele a terra do mel e da fartura, todo mundo pelado e feliz.  Esperança é a palavra de ambos os lados.

Eu, por mim, acho que esperança é uma amante abusiva. Pior do que a morte. A morte põe um ponto final. A esperança é uma corda bamba. E nós nos agarramos a ela. Não há como relaxar. Pode ser agora. Pode ser que eu atravesse. Pode ser que eu não caia.

Pode ser. É o mote da esperança. Não é o bastante, mas é o que temos pra hoje, pra nosso (des)equilíbrio mental. E olhe lá!

 

 

 

 

 

 

 

Maria Solange Amado Ladeira           02/022021

www.versiprosear.blogspot.com.br

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