Políticos e pererecas



Políticos e pererecas
Solange Amado

Pode ser bobagem, mas a velha senhora ficou assuntando. Assuntar, atualmente, é o que ela mais gosta de fazer.
Tom Zé diz que comprou de Gilberto Gil, por 200 cruzeiros (não há erro, é cruzeiros mesmo), uma geladeira, nos idos de 1964, quando Gil se casou com a Nana Caymmi. O casamento não durou, mas a geladeira, o Tom Zé disse que funciona perfeitamente até hoje.  Basta que tenha energia. Claro, energia elétrica. Para os humanos, o tipo de energia pra dar liga é outro.
É isso. A energia dos humanos tá esquisita. Não funciona, não dá liga, não há sinapse, não flui. Todo mundo voltado para o próprio umbigo.Não há uma causa comum. Se houver uma campanha contra a dengue em larga escala, vai ter uma parte da população a favor do mosquito, outra a favor do combate ao mosquito, outra contra a vacina e ainda outra fazendo poemas líricos sobre a febre e as dores eternas da vil condição humana. E nessa toada, vamos indo todos pro brejo. Desde que eu tenha razão.
Terça passada, a TV mostrava o bocudo do Presidente da República se desentendendo com o bicudo do Presidente da Camara, que dava uma entrevista, cheio de tiques, se contorcendo, como se estivesse sendo enforcado pela própria gravata. Atrás, o tradicional cordão dos puxa-sacos. Todos olhando para o próprio umbigo. A fogueira das vaidades em pleno vigor.
Ainda assuntando, a velha senhora toma um táxi. Faz um calor de cão. Lá dentro, a temperatura talvez seja como a da geladeira do Tom Zé, que já serviu a Gilberto Gil. Geladeira com um currículo de respeito. Mas só interessa à velha senhora, a temperatura, que em Brasília fica cada vez mais alta. A sucursal do inferno.
Trajeto pequeno, transito modorrento.  Vai daí que vem à tona o assunto da temperatura política. Papo vai, papo vem, o motorista, um cara muito boa praça conta um causo: “Ando muito por esses interiores afora. Uma vez, eu e um companheiro estávamos dirigindo pelo norte de Minas. Estrada de terra, calor horroroso. Eu e meu amigo estávamos com uma sede tremenda, mas a paisagem era seca e vazia. De repente, avistamos um casebre no meio do nada. Salvação da lavoura! Resolvemos parar e pedir um copo de água. O dono da casinha, foi de uma amabilidade incrível. A pobreza era absoluta, mas ele nos fez entrar. Em cima de uma mesa tosca, havia um vasilhame grande com água, coberta com um pano muito limpinho. O homem mergulhou uma concha na água, encheu um copo e me ofereceu. Alívio! Elogiei a água muito fresquinha. O sujeito agradeceu e enfiou de novo a concha,  para encher um copo pro meu amigo. Foi então que saltou lá de dentro uma perereca. Fiquei horrorizado. Além do mais, avistei um tanto de perereca  no fundo da vasilha. Pra meu espanto, o dono da casa, imediatamente botou as mãos em concha em cima da perereca que havia escapulido e colocou-a de novo dentro da vasilha. “Caramba!” Eu disse, “mas o senhor colocou de novo a perereca dentro da panela! Por que não a deixou escapar?” E ele, calmamente: “E como é que o senhor acha que a água se mantém fresquinha nesse inferno?”” A corrida acabou em gargalhadas.
Mas ficou a sementinha dando liga nas ideias: talvez esta seja a solução para o equilíbrio na temperatura da política brasileira: pererecas! Tomara!






Maria Solange Amado Ladeira                    09/04/2019
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