Aconteceu no Parque de Diversões


Aconteceu no Parque de Diversão
Solange Amado
Não gosto de Parques de Diversão. Toda aquela criançada  lambuzando a boca e a minha paciência com sorvetes, berros, chocolates, pipocas. Fico em constante estado de pânico. Parque de Diversão me dá uma saudade imensa de Herodes. E, convenhamos, não vejo nada menos sensual do que barraquinha de tiro ao alvo com bichinhos de pelúcia, e aquela parafernália eletrônica girando em luzes piscantes. O barulho chamado som, parece destinado a romper nossos tímpanos. E o que mais me assusta é que ali, as pessoas pagam prá sentir medo, pendurando-se naquelas parafernálias rodopiantes. Adrenalina é o nome da coisa que criaturas estranhas pretendem extrair dessa atividade rocambolesca, de pular de umas para outras daquelas monstruosas geringonças. Decididamente, menos erótico do que um Parque de Diversão, só reunião de condomínio. Mas foi exatamente lá, que fui dar com os costados e foi lá que pintou um inusitado “clima”. E, acreditem se quiser, descobri que essa tal de adrenalina, a gente pode descolar até num convento de Carmelitas Descalças. Quem diria!
                        Tinha mais ou menos um século e meio que eu botava um reparo atento no meu vizinho de frente. Literalmente, eu rodopiava que nem piorra ou uma daquelas geringonças do parque, em volta daquela criatura, que parecia se sentir tão atraída por mim quanto eu me sinto em relação à cotação da Bolsa. Mas eu não conseguia me ver livre da bateria de Escola de Samba que habitava meu peito na sua presença, tirante o fato de que tenho um fraco por traseiros masculinos.  Posso afirmar com certeza, que eles me dizem muito da personalidade do proprietário: alguns são firmes, redondos, diretos, audaciosos, seguros de si, outros são tímidos, enfiados, envergonhados, e outros nem aparecem, tal o receio de serem vistos; estes não merecem a minha atenção e classifico seus donos como “propriotários”. Falta personalidade. Os do meu vizinho, é claro, pertenciam à primeirissima categoria. E quando ele me confessou sua tara por parques de diversão, geringonças girando, globos altíssimos e rodopiantes, imediatamente fiz uma concessão às minhas convicções: por que não? Globo por globo... ambos são produtores de adrenalina. Meu entusiasmo por parques de diversão foi tal, que ele não teve alternativa senão me convidar prá visitar o que se instalara recentemente na cidade. Lá fomos nós. Muito antes de entrar, meu coração já era um imenso desfile na Sapucaí, luzes piscavam diante dos meus olhos e minha cabeça girava num ritmo de carrossel maluco. Mas foi na roda gigante, quanto atingimos o topo do Everest que, de repente, nossos lábios resolveram se unir. Foi combustão espontânea. Enquanto a vida corria barulhenta lá embaixo, ficamos sentados no topo do mundo balançando as pernas, na bendita bolha de silêncio e sensações que cerca os enamorados e os faz  regredir à linguagem tatibitate dos recém nascidos.Não sei se foram o giro, a roda, o carrossel, o rodopio, que nos colocaram à mercê de alguns segundos de sensações desgovernadas. O certo é que não houve happy end, não fomos felizes para sempre. Na verdade, foi meu momento alka seltzer, efervecente, rápido e que deu um alívio imediato. Me curei da paixonite. O príncipe virou sapo e a bateria da Sapucaí se aquietou, mas, continuei admirando seu traseiro. Aquele beijo foi dose de adrenalina na veia. Seja lá o que for essa tal adrenalina.


                                                Maria Solange Amado Ladeira
                  
                                                               17/04/12




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