Pesquisas


Tudo bem. Já me acostumei a viver pelas metades. Açucar faz mal. Adoçante dá câncer. Forno de micro-ondas produz no organismo um siricotico que já não me lembro qual é. Leite ao pé da vaca é mortal. Aliás, leite de qualquer jeito. Tem lactose. É mortal. Ovo? Sem chance. Aumenta o colesterol. Já o sal aumenta a pressão, e a falta dele deve aumentar a depressão, porque a vida fica com gosto de nada. Café excita. Claro, não no bom sentido, de inspirar o bom e velho sexo tórrido e selvagem, mas no mau sentido, de fazer o coração perder o rumo de casa e dar com os costados no cemitério. Coca cola desentope pia e entope as veias. Desodorante antitranspirante entope os poros, o suor vai pro cérebro e no calor, frita os neurônios. Deus me livre! Pão tem bromato, que vai envenenar lentamente seu organismo. Carne, só em raríssimas ocasiões, assim mesmo, só carne branca; vermelha nem pensar, que os cientistas são preconceituosos. Comer um índio sioux tornou-se altamente perigoso. Joguem fora os enlatados ou encaixotados, que os conservantes vão corroer seus órgãos. Tocar violino dá torcicolo. Cantar, só baixinho, que dá calo nas cordas vocais. Chuveiro quente resseca a pele. Qualquer alimento frito é mais mortífero do que o Hamas; vai penetrando nas artérias na calada da noite, e um belo dia, lança um míssil direto no coração. E babau, cara, você já era! E já vou avisando, entre o ar condicionado e o vento encanado, prefira o último. O primeiro  espalha um bilhão de bactérias no ar, você respira e se lasca todo, aliás, é melhor não respirar em lugar nenhum porque a poluição tá braba. E se você acha que vai desabrochar como as rosas, sob o efeito estufa, enfie a viola no saco. E nem vou falar em beber, fumar e furunfar. As contradições pululam.
Ah! Eu sei. Desde que a gente nasce que cada dia é um passo para o túmulo. Devagar se vai ao cemitério. Mas de preferencia, que seja bem devagarinho. E nesse meu empenho em retardar o inexorável, e levando-se em conta minhas limitações. Tiro o chapéu para as pesquisas científicas, mesmo porque é meu rico dinheirinho que está sendo usado para tão nobres e brilhantes conclusões. Se eu não acreditasse nelas, tinha de andar na rua com um nariz de palhaço e cara de paisagem.
Só fazendo um parêntese, dia desses li que pesquisadores de uma prestigiada universidade americana, depois de anos de muito trabalho, concluíram que mães reconhecem a natureza do choro dos bebês melhor que os pediatras. Descoberta que deve ter boquiaberto o mundo, tal a sua originalidade.
Então, vocês já descobriram que viver faz um mal danado pra saúde. Tem efeito colateral demais. Isso eu já absorvi, a contragosto, mas já.
Mas na verdade, o que me preocupou verdadeiramente, ou melhor, me botou de cabelos em pé, foi ler assim sem querer, desavisadamente, no livro de uma americana, de nome esquisito, Siri Hustvedt, essa pérola de um cientista chamado Paul Victor Sèze: “embora seja verdade que a mente é comum a todos os seres humanos, o emprego ativo decorrente não se aplica a todos.. Para as mulheres, na verdade, tal atividade pode ser bastante penosa. Devido à sua fragilidade natural, uma atividade cerebral mais intensa na mulher provocaria a exaustão de todos os demais órgãos e portanto, prejudicaria seu funcionamento adequado. Sobretudo, no entanto, seriam os órgãos reprodutores, que sofreriam mais com a fadiga e correriam mais riscos com os esforço excessivo do cérebro feminino”. OK. Monsieur Sèze destilou sua sabedoria no ano de 1786, mais ou menos na época em que se cria que o útero fazia um footing pelo corpo da mulher e danava a provocar um bocado de estragos, uma edição muito mais forte e mais dramática do que uma débil TPM. Na verdade, não foi a teoria infeliz que me arrepiou os cabelos; foi me certificar que suas conclusões estão dando cria. Vêm brotando, dando ramificações e atravessando os séculos até aqui, no século 21, que não tem muita coisa com que se preocupar, isso, com alguns reajustes, é claro, grudou que nem carrapato.
Até hoje, muitos milhões são gastos com essa atividade cerebral suspeita. Agora mesmo, há uma discussão animada sobre quem tem o corpo caloso (apelidado de CC) maior. Uns acham que o CC da mulher é maior, outros acham que o CC dos homens ganha do nosso. Não sei bem em que isso implica. Eu, por mim, espero que não tenha lá um CC muito grande a ponto de incomodar. Sou a favor de um CC maior no homem. Não quero extenuar minhas glândulas sudoríparas. Afinal, sou apenas uma mulher.




Maria Solange Amado Ladeira                                                                       05/08/2014

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