Ano Novo

 

                                                                                                                                                                           Ano Novo                                                     

Solange Amado

Cá no meu pedaço o ano velho passou o bastão para o ano novo delicadamente, sem fazer barulho, sem me alvoroçar. Agradeci. Isso é bom.

Não houve sofreguidão de foguetórios, batuques, suor. Nenhum arauto do apocalipse profetizando desastres, destruição e fracasso: “Bem feito! Eu não falei?”

Ao invés, botei ao lado uma taça de valpollicella bolla e mergulhei no livro de Maria Dueñas: “A verdadeira história está por vir”. O título pode até parecer profético ao alvorecer de um ano novo. Infelizmente, Maria Dueñas não conseguiu superar “O intervalo entre as costuras”. Ainda vai ficar devendo a verdadeira história. Essa foi meio arrastada, pelejenta.

É isso. Nem sempre o autor acerta a mão. O grande autor do universo tem pisado muito na bola. Ultimamente acho que ele desistiu do homo sapiens e resolveu chutar o balde. Mas não tenho certeza. E existe essa tal de esperança que, todo ano, cola na gente feito carrapato.

Minha faxineira vem trabalhar no primeiro dia do ano. Tem uma filha com uma grave doença de pulmão. A filha esteve quarenta dias na enfermaria de um hospital publico, e ela passou a maior parte desse tempo, dormindo sentada em uma cadeira dura, ao lado da cama, porque não havia enfermeiras suficientes para o turno da noite.

Chega encarquilhada, sonolenta. E feliz: “Minha “fia” veio pra casa”. A patroa bocuda diz:” mas breve ela vai precisar de oxigênio para respirar, como vai ser?” E ela: “Não sei. Ela esta respirando hoje. Quem sabe do amanhã?”

Pois é. Estamos respirando hoje. E tá me coçando o carrapato da esperança. Boa coceira pra todo mundo nesse ano que começou!

 

 

 

Maria Solange Amado Ladeira.      01/01/2020

www.versiprosear.blogspot.com.br

Nenhum comentário:

Postar um comentário